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quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Bodas de Sangue - O PRIMEIRO JURI DE QUIXERAMOBIM

A heróica vila de Campo Maior, que primeiro declarara decaída a dinastia imperial e proclamada a República, em 9 de janeiro de 1824, e em seguida, 4 de maio, repelira a constituição outorgada pelo Imperador, por ser emanada de poder incompetente, fremia de entusiasmo cívico. Naquela data ia inaugurar-se a libérrima instituição do júri, em que o cidadão seria julgado por seus pares, substituídas que foram as opressoras Ordenações do Reino Pelo Código de Processo Criminal, decretada pela Regência, após a festejada abdicação do despótico D. Pedro I.
O partido liberal, que se formara nessa aurora de emancipação política, estava empenhado em estabelecer as boas normas de aplicação da justiça na repressão ao crime, então desenfreado, triste herança dos tempos de opressão e terror.
Em virtude do decreto de 13 de dezembro de 1832, que mandava executar em todo o país o novo Código de Processo Criminal, fora modificada a divisão judiciária da província. Haviam sido criadas novas comarcas, inclusive a da vila de Campo Maior de Quixeramobim, compreendendo o seu termo: o de São João do Príncipe e o do Riacho do Sangue com o julgado de Maria Pereira (atual Joatama), o que fora resolvido pelo Conselho da Província, em sessão realizada em 6 de maio de 1833, dirigida pelo presidente José Mariano.
Justamente quando se reuniam na sede da comarca os primeiros jurados escolhidos em sorteio para as honras da inauguração do Tribunal popular, estavam na vila, no dia primeiro de março de 1834, os autores dos dois crimes importantes mais recentes. Assim, o matador de Luciano teve as preferências para a sessão dessa memorável estréia.
Foi rápido o processo. Interrogado perante a justiça, no sumário, Estácio da Gama confessou o crime, negando, no entanto que houvesse mandante; mas depois declarou que comunicara a execução do assassínio a Miguel Carlos, que então lhe prometera dar quarenta mil réis e um cavalo, o que depois repetiu perante o júri.
O juiz sumariamente lavrou a seguinte pronúncia:

“Vistos os depoimentos das testemunhas deste processo, interrogatórios de fls., informações a que procedi e constam destes autos, obrigam à prisão e livramento a Estácio da Gama, preso nas cadeias desta Vila. O escrivão lance o seu nome no livro dos culpados e intime esta sentença ao dito réu. Vila de Campo Maior, 4 de março de 1834. Manoel  Martins de Almeida Burity”.

A intimação foi feita no mesmo dia, conforme certificou nos autos o escrivão do crime José Joaquim da Silva Lobo.
O fato criminoso foi então submetido ao parecer do Júri de Acusação (que era composto de 23 jurados e foi abolido pela reforma de 1841), o qual proferiu o veredictum: “O júri achou matéria para acusação. Vila de Campo Maior, 6 de março de 1834”. Seguiam-se 23 assinaturas.
E o Juiz de Direito sentenciou:

“Proceda-se à acusação e siga-se nos termos da lei.
Campo Maior, 6 de março de 1834.
Antônio Duarte de Queiroz”.

A 14 de março compareceu o réu perante o Tribunal do Júri de Sentença, composto de 12 jurados, reunido no consistório da Matriz, sob a presidência do Juiz de Direito interino. O julgamento foi breve. Na acusação o promotor público, Manoel Alexandre de Lima Sênior, leu o libelo-crime-acusatório e frisou que se tratava de um réu-confesso, que desfechara na vítima um horroroso tiro de bacamarte, oculto numa emboscada preparada de véspera, com toda premeditação, mediante pagamento; que era, portanto, um desalmado criminoso profissional, que se alugava para matar; elogiou a vítima, cruelmente assassinada no próprio dia do casamento; e perorou referindo-se à viúva-donzela, a quem fora perversamente arrebatada a felicidade conjugal. O advogado Simão Lopes da Paz, nomeado pelo juiz, disse que procurara o réu para saber o que podia alegar em seu favor, tendo-lhe este respondido que não tinha defesa, pois que fora realmente o matador de Luciano.
Reunindo-se em conselho secreto, os doze jurados responderam aos quesitos e deram o veredictum unânime:

“o réu achava-se incurso no artigo 192 do título 2º da parte 3ª do Código Criminal, na pena de morte, no grau máximo”.

E o juiz presidente do Tribunal lavrou a sentença:

“Visto a unanimidade dos jurados, condeno o réu Estácio José da Gama em pena de morte natural.
Vila de Campo Maior, 14 de março de 1834.
Antônio Duarte de Queiroz”.

Logo em seguida foi Estácio recolhido ao oratório, servindo-lhe de confessor o padre Bento Antônio Fernandes, vigário da freguesia.
A execução teve lugar no dia seguinte, pelas quatro horas da tarde.
Saiu o tenebroso préstito, marchando à frente o porteiro do fórum, Manoel Gomes da Silva (que era o conhecido ferreiro Manoel Grazina), apregoando, em voz alta a sentença que ia ser executada. Marchavam em seguida, o Juiz de Direito e o escrivão. Vinha depois o sentenciado, assistido pelo padre Bento e enquadrado pelo destacamento composto de dez praças sob o comando do cabo Estanislau Paes Barreto.
Os sinos dobravam em sinal de finados.
O sinistro cortejo percorreu as principais ruas da vila, penetrou na Matriz, onde foi mostrada ao condenado a sepultura aberta para receber seu cadáver.
Chegando à Praça Santo Antônio, local da execução, foi o criminoso sentado em uma cadeira de pau colocada entre dois moirões fincados com uma braça de intervalo, aos quais foi ligado pelos pulsos.
Nessa posição Estácio falou:

- “Eu só matei a Luciano, porque a justiça de Quixeramobim me deixou impune pela morte que fiz na rua da Gamboa e pela tentativa de assassinato de Caeté” (referia-se a Luiz Raimundo Caeté Monteiro, que foi depois tabelião de Maria Pereira).
“Só lamento ir morrer por ter morto um, quando entre os que vão atirar em mim, há um que já fez oito mortes!”
- “Meus amigos, só lhes peço que não me deixem sofrer”.

Houve duas descargas de cinco tiros cada uma.

- “Consummatum est!” Murmurou o vigário.

O povo presenciou o espetáculo com tristeza; entre a assistência muita gente chorava.
Houve, de certo, muitas irregularidades nesse julgamento, que foi classificado pelos cronistas pósteros de “assassinato jurídico”.
Também foi o primeiro ensaio, naquele sertão da novel instituição do júri, recentemente inaugurada em todo o país.
O Capitão Antônio Duarte de Queiroz, juiz municipal, leigo. No interino do exercício de juiz de direito, era primo carnal e cunhado da noiva, viúva do assassinado, mas honesto e austero, como todos reconheciam, funcionou no processo simplesmente em obediência aos deveres do cargo, que exerceu com perfeita lisura. O seu erro foi não ter deixado correr o prazo legal de apelação, antes da execução da pena imposta pelo soberano tribunal do júri.
Censurado pelo presidente da província e processado pelo juiz de direito efetivo, sua defesa saiu triunfante: o júri de acusação, composto de vinte e três jurados, reconheceu não ter havido malícia, mas simplesmente desconhecimento de preceitos legais, estabelecendo o veredictum:
“Não há matéria para acusação”, sendo assim, impronunciado o íntegro juiz. E o próprio juiz de direito efetivo, o Dr. José Antônio Pereira Ibiapina, “que depois foi padre, missionário e morreu santo”, comunicando o fato ao presidente da província, reconheceu:

“Mandei processar o juiz municipal, mas o seu crime era ignorância e por essa razão foi absolvido no júri de acusação”.

Ignorância essa, aliás, justificável, era antes obediência às idéias correntes na época. O preceito indicado como desobedecido não constava no Código de Processo Criminal de 1832, e sim da lei de 11 de setembro de 1826 e do Decreto de 15 de novembro de 1827. Tais decretos não chegaram ao conhecimento dos patriotas então oprimidos e escorraçados, nem se vulgarizava no sertão, onde continuava a imperar a doutrina firmada pelos reiterados ofícios, do perverso ministro Clemente Ferreira França. Este, por ocasião das condenações dos revolucionários republicanos de 1824, havia determinado:

“as penas impostas pela Comissão Militar devem logo executar-se independentemente de subirem à presença imperial a buscar confirmação, ou perdão”.

E tanto era o sentimento geral naqueles tempos, que, um ano depois, em 28 de março de 1835, apareceu um decreto da Regência ordenando que:

“as sentenças de morte proferidas pelo júri contra os negros culpados, fossem imediatamente executadas, independente de subirem ao poder moderador”.

A mesma doutrina, quase nos mesmos termos dos célebres ofícios, apenas referia-se aos negros em vez de revolucionários.
Além disso, havia naquela época o sentimento exaltado de liberdade, e os jurados ciosos da “soberania popular do júri”, julgavam que suas decisões deviam ser consideradas como inapeláveis e não sujeitas ao beneplácito do poder imperial.
A censura e o processo provocados pelo açodamento com que foi aplicada a pena, aliás, justa e merecida, mostram apenas o zelo dos liberais, então no governo, pela boa aplicação das novas normas da justiça, que constituíam o seu mais puro ideal.
Assassinato jurídico!? Aprouvera a Deus que a justiça humana fosse tão honradamente aplicada!
João Cariri, o outro assassino, acusado pela morte do negociante foi condenado pelo júri à prisão perpétua, indo findar seus dias na Ilha de Fernando Noronha, então famoso presídio nacional.
No fatídico dia em que foram celebradas as enlutadas bodas, quando, ainda em casa do coronel Antônio Francisco de Queiroz Jucá (irmão de dona Joanna Baptista), em Quixeramobim, fazia-se o velório do corpo de Luciano, trazido para ser sepultado na Matriz, os Araújos, perante o cadáver, solenemente juraram vingança. Na mesma casa onde dois meses antes dona Joanna Baptista e Luciano haviam se encontrado pela primeira vez...
Do processo resultara um mandato de prisão contra o mandante do crime, que durante meses foi inutilmente procurado.
Só no inverno seguinte, quando já acreditava que seus inimigos estariam esquecidos, Miguel Carlos voltou à vida, onde se homiziou em casa de Antônio Caetano de Oliveira, casado com uma parenta sua.
Os Araújos, incumbidos de sua captura e avisados por um amigo, vieram tentar apanhá-lo.
Ao clarear do dia, quando Miguel Carlos, juntamente com alguns companheiros, tomava banho num poço do rio, seus perseguidores que se achavam ocultos no denso mata-pasto, levantaram-se de repente e marcharam sobre ele.
Os banhistas, surpreendidos, apanharam as roupas e correram em direção aos quintais das casas que marginavam o rio, tentando vestir-se às pressas ao longo do caminho.
No momento em que Miguel Carlos, apenas de ceroulas e empunhando uma faca, abaixava-se para passar pelo buraco da cerca de ramada de uma “vazante” existente na várzea, foi atingido por um tiro que lhe desfechou Manoel Araújo, irmão de Luciano, e caiu emborcado já agonizante, sem no entanto largar a faca. Quando seu inimigo, inclinando-se sobre ele, tentou virar-lhe o corpo para verificar sua identidade, o ferido num último arranco de ódio, vibrou-lhe uma facada certeira no pescoço, cortando-lhe a carótida.
Um corpo caído sobre o outro, ambos banhados em sangue, estrebuchando nas vascas da morte, apresentando o quadro horripilante de uma luta corporal entre dois cadáveres.


Bodas de Sangue (documentário)

Nas primeiras décadas do século IXX, morava entre os sertões de Tamboril e Quixeramobim, uma numerosa família de homens fortes e validos, ágeis, inteligentes e bravos. Viviam de vaqueirice e de pequenas criações, e pela fatalidade do destino vieram a fazer parte dos anais do crime no interior do Ceará, numa verdadeira guerra de família que perdurou por muitos anos. Seus maiores adversários foram os Araújos, família rica e ligada a outras das mais antigas do norte do estado que habitavam a mesma região, sobretudo na povoação de Boa Viagem, distante dez léguas de Quixeramobim.
No dia 11 de fevereiro de 1834, domingo de carnaval, pela manhã, achava-se o capitão Luciano Domingos de Araújo, jovem e rico fazendeiro de Boa Viagem, na casa de um parente seu, o português Jacintho de Souza Pimentel, na próspera vila de Quixeramobim.
Naquele esplêndido começo de inverno sentiam-se todos felizes e contentes, mas ninguém estava tão feliz quanto Luciano, que recebia dos amigos efusivas felicitações pelo seu casamento, a realizar-se no dia seguinte, com a inteligente e formosa Dona Joanna Baptista de Queiroz Barreira.
A noiva era filha do abastado criador Tenente Ignácio Lopes da Silva Barreira e de sua esposa Dona Joanna Baptista de Queiroz, proprietários da grande e antiga fazenda do Tapuiará, nas proximidades de Quixadá, onde teriam lugar as cerimônias e festas do venturoso enlace.
Em meio a tanta satisfação, entretanto, sentiu Luciano uma forte contrariedade, ao avistar, da janela do sobrado em que se hospedara, passando pela calçada fronteira, o seu inimigo Miguel Carlos Maciel, muito bem vestido e cercado de amigos e guarda-costas.
Aproximando-se a hora da missa, dirigiu-se Luciano, acompanhado de amigos para a igreja, sendo então avistado por Miguel Carlos, que se achava parado ao pé do santo cruzeiro com seu grupo, ao qual observou:

 - É pena que aquele sujeito, tão feio e ordinário, vá casar com uma moça tão bonita e prendada, e que ainda é minha parenta! Eu dava quarenta mil réis a quem impedisse esse casamento!

E no olhar sombrio que dirigiu a seus comparsas havia uma sinistra interrogação.
Existia entre os dois rancorosos rivais, alem da feroz luta entre as famílias, um outro motivo mais forte além do ódio que se votavam.
É que, por ocasião das festas natalinas, aconteceu no patamar da igreja matriz de Quixeramobim, um concorrido e rendoso leilão em benefício da igreja. Especialmente nesse leilão as prendas eram anunciadas com a declaração dos nomes de seus doadores, com a intenção de incentivar a disputa entre os licitantes, que subiam os lances em razão da homenagem que desejavam prestar ao dono do objeto oferecido.
Quando mais animada ia a festa e mais acesa a luta entre os gentis e generosos arrematantes, apregoou em alta voz, o leiloeiro:

- Um pequeno e fino lenço, primorosamente bordado em ponto de crivo, com a dedicatória:

“Para ser oferecido à gentil dona Joanninha Barreira do Tapuiará”.

- Quanto me oferecem pelo lindo presente?
- Cinco mil réis!
Luciano vendo que a oferta partia de Miguel Carlos que estava colocado do lado oposto da mesa do leilão dobrou a parada:
- Dez mil réis!
- Onze mil réis!
- Vinte mil réis!
Vendo que a competição se tratava entre os dois inimigos, ninguém mais interveio.
- Vinte e um mil réis!
- Quarenta mil réis!
Houve silêncio. Miguel Carlos voltou as costas.
- Quarenta mil réis... dou-lhe uma! Quarenta mil réis... dou-lhe duas! Quarenta mil réis... dou-lhe três!
 E o leiloeiro entregou a prenda a Luciano, a qual deveria ser entregue à moça que ele ainda não conhecia.
Dona Joanna Barreira, para fugir à curiosidade despertada pela acintosa disputa que presenciara, recolhera-se à casa que o Coronel Jucá, seu irmão, mantinha na vila, ali mesmo na praça da matriz, para os dias de festas religiosas e as freqüentes reuniões políticas.
Foi aí procurada pelo licitante vitorioso, que lhe entregou o lindo lenço, dizendo com certa jactância:

- Minha senhora, não tive culpa de que tão preciosa dádiva não tenha obtido o seu devido valor.
- Senhor, tenho o dever de aceitar a prenda oferecida em minha atenção, mas lamento muito que fosse o meu nome envolvido numa contenda que não me dizia respeito.
- Oh, minha senhora, sinto muito lhe ter causado esse desgosto; reconheço agora que agi impensadamente; faria tudo para merecer o seu perdão.
- Nada tenho que lhe perdoar, pois que o senhor não me ofendeu. Apenas rogo a Deus que abrande o coração dos homens, que só encontram na vida motivos de luta e de ódio e desconhecem as doçuras da paz e do amor ao próximo.
- Pelo que me toca, parece que Deus já fez o milagre, pois começo a perceber as doçuras da vida e a força da bondade humana.

Foi visível a impressão causada em ambos por esse breve diálogo, que lhes tocou mutuamente os corações. Quando eles se avistaram logo depois durante a missa do galo, já havia em seus olhares recíproco entendimento.
No dia seguinte o velho e bondoso Tenente Ignácio Barreira recebeu uma carta de Luciano pedindo-lhe a mão de sua filha.
Assim, antes mesmo de decorrer dois meses após o Natal, quando Joanna e Luciano se conheceram, estava Luciano naquela manhã do domingo de carnaval na Vila de Quixeramobim. Ele ia dirigindo-se à igreja pra assistir à missa, quando Miguel Carlos, ao avistá-lo, prometera em voz alta quarenta mil réis a quem impedisse o casamento de sua prima com aquele inimigo seu.
Um dos guarda-costas de Miguel Carlos, Estácio José da Gama, cabra novo, de 27 anos de idade, entroncado e forte, entendeu as palavras e o olhar do patrão como uma ordem a cumprir.
Na tarde desse mesmo dia, devidamente preparado, ele tomou o caminho por onde o noivo com o seu cortejo deveriam seguir no dia imediato em demanda da fazenda Tapuiará, em Quixadá. Como bom profissional, foi escolher antecipadamente um local próprio e seguro para a execução do plano arquitetado.
Na fazenda Cachoeira, localizada três léguas abaixo de Quixeramobim, nos limites da estrada de ferro da hoje estação de trem de Uruquê, encontrou um ponto nas condições desejadas. Beirando a estrada por onde o noivo fatalmente teria que passar havia um longo cercado; colocando-se dentro dele, ficaria protegido contra os cavaleiros do acompanhamento, visto que estes, não podendo transpor a forte cerca de pau-a-pique, teriam que rodeá-la, dando-lhe tempo de chegar ao fundo do cercado e tomar o cavalo que deixaria do lado de trás, sem risco de ser alcançado.
Para evitar que o noivo, passando rapidamente no meio do grupo de companheiros, não pudesse ser distinguido e visado com precisão, ele preparou então uma emboscada: derribou uns galhos de uma jurema ramalhuda, que caíram atravessados na estrada, deixando apenas uma estreita nesga de caminho livre junto à cerca, por onde os cavaleiros teriam que passar forçosamente, um a um.
Dentro do cercado, defronte dessa passagem cuidadosamente preparada, havia, mesmo a jeito, uma moita de mofumbo.
Entre a moita e a cerca existia uma pequena ipueira, já então cheia d’água, que abria no mato uma clareira propícia à boa visibilidade dos transeuntes na estrada e à segurança da pontaria.
A ipueira, como um fosso de lama, serviria ainda para aumentar o embaraço da perseguição.
Estava tudo em ordem. De madrugada viria pôr-se de tocaia.
E assim, na manhã seguinte, dia 12 de fevereiro, segunda feira gorda, partiu o venturoso noivo, que embalava no espírito todas as esperanças de felicidade permitidas a um rapaz de vinte e sete anos, rico, forte e mesmo bonito, malgrado a opinião de seu despeitado rival. Ia acompanhado de numerosos amigos, formando uma brilhante cavalgada, pois que todos montavam belos animais, árdegos e marchadores, que reluziam com seus arreios alcochoados de camurça e marroquim, com estribos, fivelas e passadores de prata, o maior luxo dos sertanejos ricos de então.
Nas proximidades da fazenda Cachoeira, pela antiga estrada que ligava a Vila de Quixeramobim a Quixadá, Luciano marchava emparelhado com um cunhado de sua noiva, o português Joaquim Antonio da Cunha, que viera até Quixeramobim ao seu encontro. Ao chegar ao ponto em que a estrada fora interrompida pelos galhos derribados, Joaquim Antonio tomou a dianteira e transpôs a estreita passagem ao longo da cerca, sendo seguido por Luciano.
Nesse momento troou perto o estampido de um tiro. Todos olhando na direção do som viram um homem sair da tocaia e correr para os fundos do cercado, empunhando um bacamarte na mão esquerda e um espadagão na direita. Vestia calça de riscado azul, gibão e guarda-peito de couro. Levava ainda chapéu de couro e um lenço de Alcobaça atado ao pescoço. Protegido pela cerca da perseguição dos cavaleiros, como planejara, o criminoso conseguiu fugir sem embaraço.
Luciano tendo recebido a bala no ventre, inclinou-se para frente, desfalecido, sendo amparado pelos companheiros, que o deitaram na beira da estrada, procurando reanimá-lo, enquanto se mandava buscar uma rede na casa da fazenda Cachoeira.
Enquanto isso, no Tapuiará, nessa bela manhã de inverno, tudo era festa e alegria.
Quase todos os parentes da casa, das famílias Queiroz, Lopes Barreira e Alves Lima, que ali se haviam entrelaçado em múltiplos casamentos, achavam-se presentes ou condignamente representados.
Como todos aproveitavam a feliz ocasião para envergar seus trajes de gala, havia na casa uma despretensiosa exibição de seda e veludos, de rendas e bordados e de jóias e requififes, numa inocente ostentação de luxo.
Já estava preparado o lauto banquete, com saborosas e variadas iguarias e bolos e doces em profusão.
Tudo estava preparado para a cerimônia nupcial, que seria realizada depois da missa.
Dona Joanna Baptista estava encantadora no seu vestido de noiva.
Mas já ia se tornando tarde e o noivo não chegava. Do terreiro da casa olhares impacientes alongavam-se pela estrada de Quixeramobim, na ânsia de avistar primeiro a ilustre comitiva, para dar o sinal de queimarem-se os foguetes e as ronqueiras, que estavam preparadas para a festiva e ruidosa recepção.
Mas que era aquilo que aparecia lentamente, ao longe, no caminho? Era uma rede, o meio habitual no sertão de carregarem defuntos e moribundos.
A dúvida, o temor, a certeza de uma desgraça empolgaram sucessivamente todos os presentes,
Sim, era uma rede. Vinha na frente, carregada ao ombro de dois homens. Via-se agora muito bem, estava vermelha de sangue, trazia portanto um ferido: vivo ou morto? A ansiedade tornava-se angustiosa.
Muitos saíram ao encontro do ferido, que não se sabia quem era. Mas Luciano não era visto entre os que, silenciosamente e acabrunhados acompanhavam a rede. Com certeza seria ele! Não podia haver mais nenhuma dúvida. O desespero era geral: havia lamentos, prantos, súplicas e imprecações.
Dona Joanna Baptista, vestida de noiva, pálida e trêmula, apoiou-se num esteio do alpendre para não cair. Uma dor surda despedaçava-lhe o coração.
Acercando-se da rede que chegava, vendo o noivo pálido, exangue, exclamou:

- Luciano! Que desgraça a nossa! Quem te fez isso?
- Um tiro... numa emboscada. Joanninha... ouve o que vou dizer-te... pedi que me trouxessem... quis ver-te... e perguntar... se queres casar comigo... neste estado... agora mesmo?
- De certo! Se é esta a tua vontade.
- Então chama o padre depressa!

Transferiu-se então o ferido para um leito improvisado num catre que havia no salão, em meio do choro das senhoras e cochichos dos homens, que comentavam discretamente a extravagância de um casamento naquelas circunstâncias. No entanto ninguém se opôs à decisão peremptória do noivo de casar-se imediatamente e à firme resolução da noiva de fazer-lhe a vontade.
Luciano pediu que lhe calçassem as costas com almofadas, para ficar meio sentado durante a cerimônia, que foi tocante, naquele ambiente de pena e de dor. Foram emocionantes os votos nupciais trocados perante a morte. Luciano parecia combater heroicamente, no passo extremo, em defesa de seus pundonores.
Era comovente o mudo sofrimento de Joanna Baptista: seus belos olhos claros eram fontes de lágrimas, que rolavam aos pares pelo rosto formoso, e o seio arfava-lhe em profundos suspiros, verdadeiros soluços silenciosos.
Olhos que se fitavam embaciados de lágrimas, mãos que se apertavam sentindo o gelo do túmulo. Juras murmuradas em voz débil que se ia extinguindo, e enfim, beijos ardentes em lábios frios que a morte paralisara – tão breve e doloroso himeneu de um noivo agonizante e uma noiva pura que passou à viúva sem ter sido esposa. Trocou assim imediatamente seu branco véu de noiva pelo manto negro da viuvez.
Tocante foi também a cena que arrancou lágrimas de todos os presentes, quando a noiva-viúva, num sacrifício extremo, mandou que lhe cortassem as duas longas tranças de seus cabelos castanhos, que segundo os costumes da época, deveriam acompanhar o marido no esquife mortuário.
Luciano já havia falecido, pouco depois do meio dia, quando chegaram os amigos que do lugar da emboscada tinham voltado a Quixeramobim, para avisar às autoridades policiais e buscar recursos médicos, que não passavam, aliás, de tintura de arnica e água fenicada.
Não havia naquela ocasião, na vila de Quixeramobim, um cirurgião aprovado, como foi declarado no auto do corpo de delito, procedido perante o Juiz de Paz Manoel Martins de Almeida Burity, e o escrivão Manoel Alexandre de Lima Junior, no qual por essa razão serviram como perito o Sargento-Mor João Bernardes da Cunha e como testemunhas Manoel Bezerra de Albuquerque e João Francisco Duarte que: declararam que tinha o corpo do morto um grande rombo de bala no vazio, junto à ponta do quadril, tendo o dito rombo de tamanho, em redondo, uma moeda de vintém e sair a dita bala na ponta do lombo da mesma parte, junto do rim; - que das ditas feridas morrera, passadas algumas horas, segundo a gravidade do lugar onde tinham sido feitas.

Estácio José da Gama, o matador de Luciano Domingos de Araújo, vendo que não fora perseguido, cuidou de afastar-se calmamente do local do crime, tendo, porem o cuidado de atravessar a estrada, teve o caiporismo de encontrar-se ao sair do mato, com seu primo Apolinário Lopes. Esse moço havia encontrado a comitiva um pouco mais abaixo no caminho, conduzindo a rede que transportava Luciano. Ali foi informado do crime e dos sinais do assassino, que coincidiram justamente com os de Estácio. Nessa mesma ocasião o assassino foi visto também por um vaqueiro, que passava na estrada conduzindo três bois.
Vendo-se assim denunciado, Estácio tratou de fugir para outra ribeira.
Por esse tempo, dera-se na vila de Quixeramobim um outro crime sensacional: um negociante rico que morava num sobrado, ouvindo à noite um barulho estranho e alguns ruídos provenientes do seu armazém, localizado no andar térreo, desceu para ver o que era.
Estava arrombando as prateleiras um soldado da guarda nacional, de nome João Cariri, que de supetão atravessou com o sabre o corpo do negociante quando este tentou lhe embargar a saída, e fugiu em seguida levando o sabre e a granadeira.
Os dois assassinos juntaram-se e foram ocultar-se na serra da Mombaça.
As autoridades de Quixeramobim, recebendo denúncias do paradeiro dos criminosos, oficiaram ao Capitão Manoel Honorato da Silva Limoeiro, subdelegado de polícia de Maria Pereira, comunicando as informações obtidas e ordenando a prisão dos facínoras.
Era o Capitão Honorato um diligente e pertinaz sertanejo, que vivia nas brenhas do alto Banabuiú, criando gado na fazenda Barra Nova e plantando cana e cereais no engenho Flores, uma légua distante. Tendo casado cedo, aos trinta e seis anos já tinha filhos rapazes, que o ajudavam na faina da lavoura. Alternando com essa vida pacata, exercia com sagacidade e destemor as arriscadas funções policiais, que lhe foram confiadas. Forte e ágil, calmo e intrépido, o subdelegado de Maria Pereira tornou-se famoso na perseguição dos criminosos, que tanto o temiam como o odiavam.
Recebendo a denúncia e a ordem de captura, o Capitão Honorato, conhecedor de todos os meandros dos caminhos e de todos os moradores do seu distrito, teve facilidade em apanhar um rapazinho desconhecido que descia das quebradas da serra.
Interrogando-o com habilidade e rigor, veio, a saber, que se tratava de um sobrinho de Estácio da Gama, que lhe viera trazer mantimentos no esconderijo, donde vinha voltando.
Pôde assim organizar com sua gente uma pequena patrulha, sendo acompanhado pelo rapaz, que foi obrigado, sob a ameaça de um cipó, a indicar o pouso dos criminosos.
Por uma fralda da serra da Mombaça, marchava cautelosamente a patrulha, pisando macio sem fazer ruído no empenho de apanhá-los de surpresa, quando o rapaz escorregou numa pedra e caiu, soltando ligeiro grito. O Capitão, percebendo que a queda, propositada, fora um sinal dado aos assassinos, que deviam estar muito perto, correu para frente, com os companheiros, num rápido assalto. Os dois criminosos, surpreendidos, tiveram que fugir com tanta urgência, que nem tempo tiveram de apanhar as armas; correndo e pulando por grotões abaixo, não puderam ser alcançados, apesar de renhida perseguição.
No rancho abandonado às pressas, ficaram dependuradas as armas e as mochilas de provisões e as redes armadas sob a pequena coberta de palha de pindoba. Junto ao fogo, em que ardiam, cobertos de cinza, tições de catingueira, que não se apagavam, estava espetado sobre as brasas, assando no próprio casco, um tatu verdadeiro, gordo e cheiroso, que não foi desprezado.
O Capitão Honorato, muito desapontado por ter perdido o bote, que julgava certo, recolheu o bacamarte de Estácio da Gama e a granadeira de João Cariri, guardando-os em sua casa, como troféus da malograda expedição.
Na semana seguinte os dois criminosos, já providos de novas armas, abordaram na estrada de Maria Pereira um viajante, por quem mandaram avisar ao subdelegado que se preparasse, que eles viriam buscar as armas tomadas.
Recebendo o atrevido recado, o Capitão Honorato pensou em precaver-se para receber a afrontosa visita anunciada. Acostumado, porem, a ligar pouca importância aos riscos de sua vida perigosa, e não querendo parecer que ficara com medo de ameaça dos dois bandoleiros, desprezou os conselhos da prudência. Determinou então que seus filhos, agregados e escravos seguissem para o sítio Flores, onde havia muito serviço urgente naquele princípio de inverno, quando o mato crescia rapidamente, ameaçando afogar as plantações ainda muito tenras. Na fazenda Barra Nova, que era só de criação, era pouco o serviço.
Naquela manhã chuvosa dos fins de fevereiro, estava o Capitão Honorato no curral, de calça arregaçada, pisando na lama, tirando o leite das vacas, auxiliado por um negrinho que ia soltando os bezerros. Desleitava a última vaca, quando ouviu um cumprimento que lhe era dirigido da porteira do curral:

- Sr. Capitão, bom dia!
Voltando a cabeça, viu debruçados sobre os varões da porteira os dois criminosos, bem armados.
- Bom dia. Que desejam?
- Queremos uma palavra, Sr. Capitão.
- Esperem um momento enquanto acabo o meu serviço que eu estarei às ordens.
Escorrupichou os peitos da vaca, puxou a ponta do arrelhador, soltando o bezerro, e disse aos visitantes:
- Façam o favor de arrodear para a frente da casa, que lá irei atendê-los.

E sem esperar resposta dirigiu-se para os fundos da casa, que davam para o curral, levando na palma da mão esquerda a cuia de leite e o arrelhador jogado sobre o ombro, na postura habitual; nisso ouviu atrás de si uma voz:

- Não atire no homem!

Percebeu assim que uma arma lhe fora apontada pelas costas; não se voltou; continuou a marchar como se nada ouvira; apenas esguiou a barriga, parecendo-lhe que ficara da grossura de um dedo.
Despejando o leite no pote sobre o jirau, entrou pela porta da cozinha e viu que sua esposa estava apavorada; e lhe pediu:

- Minha mulher! Pelo amor de Deus, não dê sinal de medo!

E por via das dúvidas, trancou-a na despensa, donde tirou um par de cordas de carnaúba, que entregou à escrava cozinheira, dizendo-lhe:

- Fique aqui, com estas cordas, sem fazer o menor barulho; quando eu chamar, leve as cordas, para amarrar os cabras.

E saiu para a sala da frente, completamente desarmado, e convidou os dois homens a entrarem. Estes se entreolharam desconfiados, mas, insistidos, entraram, ficando de pé no meio da sala, sustentando as armas na posição de sentido.
Honorato fechou a banda inferior da porta, que era partida horizontalmente ao meio, e calcou bem a tramela, que era muito apertada.

- Sentem-se, disse-lhes, indicando um banco.
- Muito obrigado; a conversa é pouca.
- Estou às ordens.
- Capitão Honorato, nós viemos buscar as nossas armas.
- Se eu entregar essas armas, ficarei desmoralizado em toda a comarca. Vamos, porém, entrar num acordo; darei uma bolsa de ouro a cada um...
- Nós queremos as armas.
- Naquele cercado tenho dois cavalos muito fortes e naquele quarto bons arreios...
- Nós só queremos as armas.

Honorato chamou o moleque e pediu água para lavar as mãos. E continuou querendo mostrar as vantagens de suas propostas aos obstinados antagonistas.
Volta à sala o negrinho com a bacia d’água; e vendo que seu senhor esticava os braços para diante sungando as mangas, pôs-se-lhe na frente, apresentando a bacia, e voltando as costas para os dois facínoras.

- Oh! Atrevido! Gritou-lhe Honorato, dás as costas a estes senhores?!

E ao mesmo tempo, com as costas da mão, deu-lhe violenta bofetada, o que fez rolar com a bacia para um canto da sala. Os dois cabras, como era natural, acompanharam com a vista o espetacular trambolhão do moleque.
Outra coisa não queria Honorato. Pulou como tigre sobre eles, atingindo violentamente com os pés o estômago de Estácio, que caiu desacordado, e arrancando com as mãos possantes e destras as armas de Cariri, que esmoreceu e ficou sem ação, sob a mira de seu próprio clavinote, manejado pelo agilíssimo Capitão.
Honorato chamou então a escrava, que seguindo suas ordens, atou com arrochados “nós-de-porco” os braços de Cariri, que foi amarrado ao esteio.
Só então é que Estácio foi recobrando os sentidos; e vendo a própria situação em que se achava, suplicou:

- Não me faça mal, que eu não deixei que Cariri lhe atirasse pelas costas!
- Eu ouvi a sua intervenção; fico-lhe muito agradecido; mas agora nada posso fazer; tenho que cumprir as ordens que recebi; é meu dever e Estácio foi amarrado, dizendo:
- Está direito, Sr. Capitão; bem dizendo o ditado: “quem seu inimigo poupa nas mãos lhe morre”.

Honorato porem, ficou vacilante. Muitas vezes teve ímpetos de soltar o preso, que lhe salvara a vida. Mas o sentimento do dever suplantou o da gratidão.
Os dois criminosos foram enviados para Quixeramobim, onde entraram em meio de grande regozijo popular, sendo entregues à justiça.
O extraordinário desse caso é que o bravo sertanejo nunca pensou em negociar com os cabras; puxou conversa tão somente para distraí-los; seu único propósito era amarrá-los e tinha plena confiança de o conseguir.
O admirável feito do subdelegado de Maria Pereira foi narrado pelo jornal oficial e mereceu do público aplauso unânime. O presidente da Província, empenhado em reprimir energicamente o crime, que até então campeava impune, pediu ao governo de Regência uma recompensa condigna para os relevantes serviços prestados à justiça pública pelo valoroso sertanejo, a quem foi concedida a insigne distinção da Comenda Ordem de Cristo.
Mas o modesto fazendeiro, avisado de que teria de pagar na Alfândega os emolumentos regimentais para receber o honroso título, desistiu da alta mercê, explicando aos amigos:

- Tinha muita graça: um matuto comendador! Seria um motivo de troça. Era só o que faltava!
E foi impossível convencê-lo do contrário.

O Capitão Honorato acabou seus dias na fazenda Barra Nova, atingindo a idade de 89 anos, já então cego, mas com plena lucidez de espírito.


Brasões das Famílias QUEIROZ e BARREIRA

A família BARREIRA, sua origem e descendência:


BRASÃO
da Família BARREIRA

"A língua portuguesa, assim como o francês, o espanhol e o italiano, é considerada língua românica e se derivou do latim. Desenvolveu-se no antigo reino da Galícia e se espalhou pela região que hoje é conhecida como Portugal.
O sobrenome  BARREIRA é classificado como sendo de 'origem habitacional'. Ou seja, este termo se refere aos sobrenomes dos quais a origem se encontra no lugar de residência do portador original. Nomes habitacionais nos dizem de onde foi saído o progenitor da família, seja uma cidade, vila ou lugar identificado por uma característica topográfica. No que diz respeito ao sobrenome BARREIRA, este é derivado do nome de diversos locais em Portugal. Este sobrenome é encontrado na Galícia e tem como variantes BARREIROS, BARREIRAS. Uma das mais antigas referências e este nome ou a uma variante são os registros de BALTHAZAR BARREIRA (1538-1612), jesuíta português falecido em 1590.
Pesquisas continuam, e este nome pode ter sido documentado muito antes da data mencionada acima. Portanto notáveis do sobrenome BARREIRA ou uma variante foram entre outros: Francisco Izideo Barreira, religioso escritor português, falecido em 1634; Gaspar Barreira, cônego, cosmógrafo e escritor português, falecido em 1574.

As armas foram concedidas à família BARREIRA pelas autoridades de Portugal e assim descritas:

BRASÃO DE ARMAS:

“O OURO simboliza o SOL, denota Generosidade e Nobreza.
Os que portam esta cor devem lutar pelo seu príncipe. O vermelho indica magnanimidade”.

Desta família descende BATHAZAR LOPES BARREIRA,
que no Brasil, e especialmente no Ceará,
foi o progenitor dessa extensa descendência que passamos a desenvolver."

Nota - Artigo enviado pelo primo Paulo Barreira


*  *  *  *  *  *  *

ÍNDIA PIABA
Francisca Barbosa Custódio

“Pelas proximidades do ano de 1680, ao que se calcula, o português Custódio de Britto viu a jovem índia Piaba de Cunhaú, filha do cacique da aldeia de Natal e de sua mulher Rita da Estrela.
A bela cunhatã, de olhos lânguidos, dentes brancos e seios pulados, que tentavam furar a bata de xila, que mais a adornava que a vestia, encheu de desejos o luso forasteiro, que fez tudo para conquistá-la.
Mas a altiva princesa potiguara mostrou-se recatada e esquiva. O namorado recorreu então ao frade missionário, que catequizou o chefe índio, tomando este no batismo o nome de Estevão Barbosa, e conseguiu o casamento de Custódio com a formosa Piaba de Cunhaú, que, pelo batismo e pelo matrimônio, passou a chamar-se Francisca Barbosa Custódio.
Dessa união resultou apenas uma filha, que tomou o nome de Antônia Rita de Brito Barbosa e se tornou uma vistosa mameluca, que prendeu de amores o português Lourenço de Sá e Souza, com quem se casou.
Lourenço e Antônia Rita criaram três filhos, sendo o terceiro uma menina, Maria Joana de Sá Barbosa, que se casou com Felippe Santiago da Silva, natural de Braga, em Portugal, indo o casal morar em Aquiraz, no Ceará, onde criou quatro filhos, sendo que Antônia da Silva e Sá Barbosa, a caçula, na idade de casar, era uma moça branca e fina, sem nenhum traço da raça de sua bisavó índia.
Por esse tempo chegou à Santa Cruz do Aracati, antes São José do Porto dos Barcos, na foz do Jaguaribe, o comerciante português Balthazar Lopes Barreira, natural de Bragança, freguesia de Chaves, filho de José Lopes de Andrade e de Anna de Assis Barreira, o qual, depois de andar negociando por Minas Gerais, Bahia, Sergipe e Pernambuco, viera atraído pela fama dos sertões de criação do Ceará, e estabeleceu-se na ribeira do rio Pirangi, onde fundou a grande e famosa fazenda do Quixinxé.
Balthazar, encontrando seu conterrâneo Felippe Santiago, veio a conhecer sua filha Antônia (bisneta da índia Piaba)*, com quem se casou, em Santa Cruz, no dia 16 de abril de 1733, indo morar em Quixinxé, onde criou dez filhos.”

(Esperidião de Queiroz – Antiga Família do Sertão)

Em 1680, o português Custódio de Brito casou-se com a índia Piaba de Cunhaú, filha do cacique da aldeia de Natal, e que pelo batismo e pelo matrimônio recebeu o nome de Francisca Barbosa Custódio. Tiveram uma filha:

- Antônia Rita de Sá Barbosa, c.c. o português Lourenço de Sá e Souza, tiveram 3 filhos, entre eles:

- Maria Joana de Sá Barbosa, c.c. Felipe Santiago da Silva, português de Braga, foram morar em Aquiraz e tiveram 4 filhos, entre eles:

- Antônia da Silva e Sá Barbosa (bisneta da índia Piaba), c.c. o português Balthazar Lopes Barreira, em 16/04/1733.
Foram morar na fazenda Quixinxé em Quixadá e criaram 10 filhos:

- Ana Maria do Carmo Barreira
- Antônia Maria do Carmo Barreira
- Joanna da Silva Lopes Barreira
- Francisca Maria Lopes Barreira
- Antônio Lopes da Silva Barreira
- *Ignácio Lopes da Silva Barreira, c.c. Joanna Batista de Queiroz
- Leandra Maria da Silva Barreira
- Josepha Maria da Silva Barreira
- Izabel Lopes da Silva Barreira
- José Lopes da Silva Barreira

*Ignácio Lopes da Silva Barreira, c.c. Joanna Batista de Queiroz, tiveram 14 filhos, entre eles, Joanna Ignácia de Queiroz Barreira (Dona Joanninha), que se casou duas vezes. Seu primeiro casamento foi com Luciano Domingues de Araújo, jovem e rico fazendeiro de Boa Viagem. No dia marcado para as bodas, vinha o noivo da cidade de Quixeramobim, acompanhado por muitos amigos, todos a cavalo, seguindo em cortejo para a fazenda Tapuiará, em Quixadá, onde morava a noiva. Quando passavam pela fazenda Cachoeira, no distrito de Uruquê, sofreu uma emboscada e foi mortalmente ferido por um tiro de bacamarte, a mando de um inimigo seu Miguel Carlos Maciel. Luciano foi conduzido em uma rede até a casa da noiva, onde tudo estava preparado para os festejos nupciais. Por desejo de ambos, foi realizado o casamento assim mesmo, tendo ele falecido logo após a comovente e breve cerimônia, deixando viúva dona Joanninha, aos dezenove anos de idade. Uma cena mais tocante ainda foi quando a noiva-viúva, num gesto extremo e contrito de mudo sofrimento, mandou que lhe cortassem as duas tranças de seus longos cabelos castanhos: segundo os costumes da época, deviam acompanhar o marido no esquife mortuário.


(Essa história está relatada no capítulo intitulado BODAS de SANGUE, no livro Antiga Família do Sertão, de autoria do médico e escritor cearense Esperidião de Queiroz Lima).

Passados alguns anos desse trágico acontecimento, casou-se dona Joanninha, em segundas núpcias, com o irmão de um de seus cunhados (eram três irmãos da família Alves Lima casados com três irmãos da família Barreira), Francisco Alves de Lima, viúvo e com cinco filhos menores, todos homens.
Depois do casamento eles foram morar na fazenda Poço Formoso em Jaguaribe, onde nasceram seus cinco filhos:

Francisca, Maria de Jesus, Francisco, Ignácio e Arcelino.

Depois que faleceu Francisco Alves de Lima, Joanna resolve se mudar com os cinco filhos ainda pequenos para Quixadá, onde já residia quase toda a sua família, que bem poderia ampará-la e ajudá-la na sua educação, o que de fato aconteceu. Passaram a residir na fazenda Espírito Santo, próxima a Quixadá. As duas filhas logo casaram e os três filhos homens, depois de concluírem o curso primário, sempre incentivados por sua mãe, decidiram-se pela vida de fazendeiros, seguindo a tradição da família e até pela falta de opção naquela época.

As duas filhas, Francisca e Maria de Jesus:

F01 - Francisca Barreira de Queiroz Lima (Chiquinha), casou-se com Manoel Porfírio Freire Soares e tiveram quatorze filhos. O casal instalou-se por algum tempo na fazenda Olivença, vizinha à fazenda Espírito Santo, seguindo depois para a Amazônia e se estabeleceram em Belém, onde deixaram numerosa descendência.

F02 - Maria de Jesus Barreira (Mãe Jesus), casou-se com José Marinho Falcão, e foram os prósperos proprietários da fazenda Fonseca em Quixadá. Tiveram duas filhas:
N01- Joanna Lydia Barreira, c.c. Gaudioso Simão de Castro Góes, pais de José Marinho Falcão de Góes, c.c. Angelina de Góes Ellery*. O casal não tinha filhos, por isso perfilhou o sobrinho de Angelina, registrado como José Ellery Barreira, nascido em Quixadá, em 23/10/1923, que depois adotou o nome de José Ellery Marinho de Goes, meu pai.


Joanna Lydia e Gaudioso foram pais também de: Francisco Marinho de Goes (Tio Goezinho), c.c. Olívia Holanda; Júlia Marinho de Goes (Tia Julinha), c.c. o Prof. Júlio Holanda; Maria Marinho de Goes (Tia Mariinha) c.c. Dr. Esperidião de Queiroz Lima, médico; Clotilde Marinho de Goes, c.c. Dr. João Batista de Queiroz Lima, médico, irmão de Esperidião de Queiroz Lima (os dois eram filhos do Dr. Arcelino de Queiroz Lima e de dona Rachel de Queiroz Lima, da Fazenda Califórnia).

N02- Maria (Neném), c.c. Dr. Adolpho Siqueira Cavalcanti, pernambucano e primeiro juiz de direito de Quixadá, não tiveram filhos.

Os três filhos, Francisco, Ignácio e Arcelino:

F03 - Cel. Francisco Alves Barreira Cravo, nascido a 09/12/1859, c.c. Maria de Jesus Marinho, foram os donos da fazenda Bolívia, próxima à cidade de Quixadá, tiveram quatorze filhos. Francisco tinha desde criança o cognome "Cravo", que adotou passando a assinar-se Francisco Alves Barreira Cravo. Fazendeiro esclarecido, foi um dos pioneiros na disseminação do Gado ZEBU no Ceará. Dirigiu, como intendente, os destinos do município (1893-1895), tendo construído o prédio que ainda hoje serve de sede da municipalidade. Anteriormente, fizera parte, como deputado, da Assembleia Constituinte do Estado. Era conhecido como Tenente Cravo, não obstante ter a patente de Coronel. Tendo-se transferido para o Estado do Rio de Janeiro em 1921, faleceu em Niterói a 05/01/1939. Foram pais de:

N01 - Francisco Alves Barreira, c.c. Francisca Edwirges
N02 - Fausto Barreira Cravo, c.c. Antônia Bela Pessoa Lima
N03 - Aprígio Alves Barreira Cravo, c.c. Margarida Cabral
N04 - Samuel Barreira Cravo, c.c. Clotilde Amaral de Assis
N05 - Zorobabel Barreira Cravo, farmacêutico, c.c. Laura
N06 - Dráurio Barreira Cravo, médico e fazendeiro, c.c. Luiza Niemayer
N07 - Maria da Assunção Barreira, c.c. José Alexandrino de Alencar
N08 - Cleonilda de Jesus Barreira, c.c. Dr. Caetano Estelita Cavalcante Pessoa, foi Presidente do Estado da Província do Ceará
N09 - Elvira Marinho Barreira, c.c. Pedro Theóphilo
N10 - Alvina Barreira Cravo, c.c. Francisco Augusto Alencar
N11- Maria do Carmo Barreira, c.c. Manoel Pirette da Silva Guimarães
N12 - Maria de Jesus Barreira, c.c. Francisco de Paulo F. Sousa
N13 - Otília barreira Cravo, c.c. Otaviano da Cunha Mendes
N14 - Esther de Jesus Cravo, c.c. Júlio César Machado, farmacêutico


F04 - *Cel. Ignácio Alves Barreira Nanan*, conhecido como Coronel Nanan, c.c. Maria Francisca Lessa Barreira (Mulatinha ou Mãe Tatinha). Foram os donos da fazenda Olivença, também próxima à cidade de Quixadá e criaram doze filhos.

F05 - Cap. Arcelino Alves Barreira, c.c. Francisca do Espírito Santo Lessa, não tiveram filhos.

Os filhos, Maria de Jesus Barreira e Francisco Alves Barreira Cravo, casaram-se respectivamente com dois irmãos: José Marinho Falcão e Maria de Jesus Marinho.


Cel. IGNÁCIO ALVES BARREIRA NANAN

*Cel. Ignácio Alves Barreira Nanan* - (Pai Nanan), meu bisavô paterno, nasceu na fazenda Poço Formoso em 01/02/1841, nas proximidades da atual cidade de Morada Nova. Muito jovem ainda, após o falecimento de seu pai Francisco Alves Lima, transferiu-se com sua mãe dona Joanna Batista de Queiroz Barreira e seus irmãos, para Quixadá, onde já residia quase toda a sua família.

Casou-se em 22/11/1864 com Maria Francisca Lessa Barreira, nascida em 07/07/1849 (conhecida por Mulatinha ou Mãe Tatinha), filha de José Francisco dos Santos Lessa e Maria Nazareth de Lima Lessa. Seu avô era José dos Santos Lessa, homem rico e poderoso chefe político de Quixeramobim, filho de portugueses. Após o casamento passaram a morar na fazenda Olivença, em Quixadá.
Ignácio tinha desde pequeno o apelido de “Nanan”, por isso adotou este codinome passando a assinar-se Ignácio Alves Barreira Nanan, e mais tarde ficou conhecido simplesmente por Coronel Nanan.
Desse casamento sobreviveram doze filhos que casaram e constituíram uma das maiores famílias do sertão cearense.

OS DOZE FILHOS DO CORONEL NANAN 

Os doze filhos do CORONEL NANAN e DONA MARIA FRANCISCA LESSA BARREIRA:

N01 – Joanna Francisca Barreira (Noca), c.c. Isaac Correia do Amaral
N02 – Maria Lessa Barreira, c.c. João Firmino Dantas Ribeiro, Desembargador, foi Presidente do Tribunal de Justiça do Ceará (deu nome à Rua Desembargador João Firmino Dantas Ribeiro, no Bairro Jardim América, em Fortaleza)
N03 – Américo Alves Barreira, médico, professor e jornalista (05/04/1858-11/06/1910), c.c. Adelaide Paraíso. Nasceu na fazenda Espírito Santo e se formou em medicina pela Faculdade de Medicina da Bahia. Foi professor catedrático da Faculdade de Odontologia da Bahia e durante muitos anos foi redator do jornal Diário de Notícias, em Salvador.
N04 – Francisca Edwirges, c.c. o primo Francisco Alves Barreira Cravo, filho do seu tio, Maj. Francisco Alves Barreira Cravo
N05 – Francisco Barreira Nanan, c.c. Otília Teixeira Mendes
N06 – Adélia Barreira Nanan (Déa), c.c. o Dr. Bernardo Piquet Carneiro* (RJ, 27/06/1960-31/10/1936), Engenheiro construtor do açude do Cedro em Quixadá.
N07 – Maria Francisca Barreira* (Lica), c.c. Dr. Antonino da Cunha Fontenelle
N08 – Maria Lessa Barreira (Santinha), c.c. o Desembargador Luis Gonzaga Gomes da Silva (tem seu nome numa avenida de Fortaleza - Avenida Desembargador Gonzaga - no Bairro Cidade dos Funcionários)
N09 – IGNÁCIO BARREIRA NANAN, Engenheiro Agrônomo, c.c. Cora de Goes Ellery, meus bisavós paternos. Depois de viúvo Ignácio casou em segundas núpcias com sua cunhada, Ana de Goes Ellery (tia Nóca), irmã de Cora e de Angelina Ellery Marinho de Goes, a mãe que criou meu pai (registrado como José Ellery Barreira, depois foi perfilhado pela sua tia materna, Aneglina Ellery Marinho de Goes e seu marido, José Marinho Falcão de Goes, como José Ellery Marinho de Goes, Zelito)
N10 – Odília Barreira (Dila), c.c. Francisco Bezerra de Figueiredo
N11 – Arcelino Sula Barreira, Advogado e Cirurgião Dentista, c.c. Idalba Barreira
N12- Teolinda Barreira Nanan (Teté), c.c. Luis Alencar Barbosa Cordeiro


Bernardo Piquet Carneiro* (RJ, 27/06/1960-31/10/1936), engenheiro brasileiro, formado pela ESCOLA CENTRAL DA CORTE (atualmente Escola Politécnica do Rio de Janeiro) onde adquiriu o título de Bacharel em Ciências Físicas e Matemáticas em 1897. Ainda no ano de 1897 chega ao Ceará, como engenheiro-chefe da Estrada de Ferro de Baturité (Rede de Viação Cearense). Em 1900 foi nomeado engenheiro-chefe da Comissão do Açude do CEDRO em Quixadá. Piquet Carneiro deixou o cargo de diretor da então recém-criada Inspetoria de Açudes e Irrigação (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS) em 1909 e assumiu o cargo de chefe do Primeiro Distrito de Fiscalização de Estradas de Ferro, função que exerceu até 1914, quando retornou ao Rio de Janeiro.
Foi dele também o projeto do Açude ACARAPE do MEIO, que abastece Fortaleza.
Em sua honra o distrito de Jirau (que depois passou a município) no estado do Ceará recebeu o seu nome: PIQUET CARNEIRO.
PIQUET CARNEIRO é o bisavô do piloto de Formula 1 NELSON PIQUET, filho de Clotilde Barreira Piquet e do médico pernambucano, Dr. Estácio Gonçalves Souto Maior, ex-ministro da saúde. O pai não aprovava sua carreira automobilística e por essa razão, no início de sua carreira, Nelson usava o nome de solteira de sua mãe, escrito erroneamente como "Piket", para esconder sua identidade. Sua mãe faleceu em agosto de 2007 aos 84 anos de idade.
Adélia Barreira e Piquet Carneiro também foram pais do ilustre Dr. Américo Barreira Piquet Carneiro (1909-1992), médico e professor cearense que desempenhou uma brilhante carreira no Rio de Janeiro.

Maria Francisca Barreira* (Lica), casado com o Dr. Antonino da Cunha Fontenelle* foram os pais de Antonino Barreira Fontenelle (Fontim), pai de Luce Fontenelle de Carvalho, casada com Cid Saboia de Carvalho (25/08/1935) advogado, professor, jornalista, radialista e político cearense, foi senador pelo Ceará, e são os pais do Dr. ANTONINO FONTENELLE DE CARVALHO, advogado e professor de Direito Agrário na UNIFOR. 

O CORONEL NANAN 

– Agricultor e pecuarista experiente, o Coronel Nanan gostava muito de adquirir novas propriedades, por isso era sempre procurado pelos que conheciam ou ouviam falar de suas condições financeiras e do seu gosto pela terra. E quando alguém interferia em seus negócios, especialmente sua esposa, argumentando que já eram donos de tantas terras, ele lhe respondia com enfado: “Terra não morre!” – E efetuava assim a compra de mais uma propriedade. E tanto investiu no seu trabalho que ao falecer em 26/04/1920, beirando os oitenta anos de idade, ele possuía mais de uma dezena de sítios na serra de Baturité, boas propriedades produtoras de café e de cana-de-açúcar, e outras tantas fazendas situadas nos municípios de Quixadá e de Quixeramobim.
Dedicou-se extremamente à política, sempre respeitoso para com seus correligionários. Sua fidelidade era inquebrantável, daí o prestígio que sempre gozou na política. Não obstante exercer a chefia política do município de Quixadá por mais de vinte anos, nunca concordou em ocupar nenhuma função pública. No Dicionário Bibliográfico do Ceará escrito pelo honrado cearense Dr. José Bonifácio de Souza, consta no registro biográfico do coronel Nanan:


“Homem inteligente, apesar de pouco letrado, granjeou sólida fortuna, tornando-se um dos mais importantes fazendeiros do seu município, e conquistou respeito e admiração através de marcantes qualidades pessoais servidas por um trato lhano e acolhedor. Durante cerca de um quarto de século a vida municipal de Quixadá gravitou em torno da sua pessoa. Ao contrário dos coronéis truculentos que naquela época proliferavam no Estado, sabia o coronel Nanan, com brandura, tolerância e sagacidade, fazer valer sua influência não só entre aqueles que o tinham como chefe partidário, como também junto aos poderes públicos. No largo período em que foi governador, deu-lhe o Comendador Acioli, inteiro apoio em retribuição a uma leal e sincera solidariedade política. Entretanto, jamais quis o chefe quixadaense exercer  funções públicas para os quais o credenciava o seu sólido prestígio eleitoral.”

– Estas expressões duplicam seu valor ao serem proferidas pelo Dr. José Bonifácio, sendo ele filho do coronel Alfredo Pereira de Souza que, durante anos foi o adversário político mais expressivo do coronel Nanan.


No livro QUIXADÁ & SERRA do ESTÊVÃO, o Dr. José Bonifácio faz outra referência ao Coronel Nanan e à sua Fazenda Olivença, em Quixadá:

Fazenda Olivença – A influência social, política e econômica de seu proprietário Inácio Alves Barreira Nanan, ou simplesmente Coronel Nanan, tornou famosa esta fazenda, localizada a seis quilômetros da cidade.
Pode-se afirmar que, por espaço de um quarto de século, foi ali que se resolveram os destinos políticos do município, do qual o Cel. Nanan era chefe incontrastável, e para ali convergiam, atraídos pela fama de trato acolhedor e um convívio fidalgo, todas as figuras de prol – bacharéis, médicos, engenheiros, etc. – que chegavam a Quixadá.
Além disso, foi também das primeiras fazendas a banir o trabalho servil, tendo alforriado seus escravos a 31 de março de 1883, por ocasião do enlace matrimonial de uma das prendadas filhas do casal com o abolicionista Isaac Amaral, no auge da campanha antiescravagista que sacudia todo o país.
Desaparecidas a primeira e a segunda geração daqueles que lhe deram brilho e renome, volveu Olivença à modesta placidez de um destino puramente econômico.”


A respeito da CAMPANHA ANTIESCRAVAGISTA, o Coronel Nanan foi um dos fundadores da Sociedade Libertadora Quixadaense, criada em 1º de janeiro 1883, tendo ele ocupado os cargos de presidente e de vice-presidente.


O Coronel Nanan, nascido na fazenda Poço Formoso em 01 de fevereiro de 1841, faleceu com quase oitenta anos em Quixadá, a 26 de abril de 1920.
Dona Mulatinha faleceu em Fortaleza a 15 de janeiro de 1925, estando ambos sepultados no jazigo da família, em Quixadá.


“Não só de heroísmos, de batalhas, de revoluções patrióticas consta um passado nacional: também do que esse passado foi como vida quotidiana, como rotina econômica, como produção, como trabalho, como intimidade doméstica.”
Gilberto Freyre




Vovô Ignácio Barreira:
por Ricardo Lincoln Barreira (bisneto)



"Ele não colocava nome nas vacas, como é costume e tradição entre os fazendeiros criadores de gado, quando acontece a primeira parição das “novilhas” - dizia que quando se põe nome num animal, cria-se afeto e apego por ele e assim não se pensa em vendê-lo. Como ele tinha entre seus grandes negócios a compra e venda de gado, isso poderia inviabilizar ou dificultar o "ato de vender".
“Encaminhava os filhos segundo a virtude que ele observava em cada um. O tio Chiquinho (Francisco Barreira Nanan), tinha muito jeito para comércio e foi para o Acre, ganhar dinheiro com extração e comércio de borracha. O tio Américo (Américo Alves Barreira), muito estudioso, ainda estudante, falava fluentemente o alemão (supostamente aprendido com o padre Kiliano, em Pacoti), foi cursar medicina na Bahia (naquela época, a única escola de Medicina no Nordeste) e lá foi um dos fundadores do Curso de Odontologia. Não havendo professor para a disciplina de Prótese Dentária, ele veio a ser o professor titular. Nessa época, conheceu sua esposa Adelaide, com quem se casou.”

“Deu como presente de casamento à sua filha Joanna Francisca (Nóca), que casara com o abolicionista Isaac Amaral, a alforria de todos os escravos que viviam em suas terras (e eram muitas!) e segundo o papai, todos permaneceram onde estavam por vontade própria. Ainda segundo as informações do papai, a primeira libertação significativa de escravos no Ceará teria sido por ocasião do casamento da tia Déa (Adélia Barreira Nanan), com o engenheiro Piquet Carneiro, em 1884, precedendo assim a Redenção, acontecida em 13 de maio de1888.”
“Piquet Carneiro, (que era padrinho do papai) estava finalizando as obras da construção do açude do Cedro, em Quixadá, quando recebeu a visita da comitiva de Affonso Pena (salve engano), de quem era inimigo político e estava prestes a assumir a Presidência da República A visita foi feita, mas quando a comitiva se retirou, ele (Piquet Carneiro) convocou toda a equipe e informou que aquele homem seria o próximo Presidente da República e sabia ele, que os seus dois primeiros atos seriam a suspensão da construção do Cedro e a sua demissão. Queria assim, contar com todos para que a obra fosse concluída antes que ele tomasse posse e todos concordaram. Dito e feito!”
Primeiro ato: "Suspendam-se as obras!”. Resposta imediata: "Obra concluída!"
obs.: alegava a equipe do presidente que havia um erro de cálculo e que a parede da barragem seria "lavada" antes do açude sangrar.
Segundo ato: "Demissão do Dr. Piquet Carneiro!”, ato que ele acatou, mas deixou registrado:
"Peço a Deus anos de vida para ver o açude do Cedro sangrar sem que isso aconteça".

Ele não viu, mas a tia Déa viu (ou pelo menos soube da notícia) por duas vezes: em 1923 (aos 50 anos de idade) e em 1973 (aos 100 anos). Ela faleceu, salve engano, com 101 ou 102 anos.

“Quando o Ceará possuía apenas três ou quatro desembargadores, dois deles eram seus genros:

João Firmino - que deu nome à Rua João Firmino, no Bairro Damas, próximo ao Colégio Juvenal de Carvalho.
Luís Gonzaga - que é nome de uma avenida, na Cidade dos Funcionários - Avenida Desembargador Gonzaga.”

“Era na casa do tio Gonzaga que a mamãe passava os finais de semana, já que ela estudava interna no Colégio Santa Cecília. Esse nome tio Gonzaga era a cara da mamãe e acho que se ela viva fosse, disse ao Juarezinho, chamaria a avenida de "Avenida Tio Gonzaga", rsrs.

Ricardo Lincoln Barreira


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Ignácio Barreira Nanan

*Ignácio Barreira Nanan, Engenheiro Agrônomo, nascido em Quixadá em 16/02/1880, casou-se em 02/02/1904 com Córa de Góes Ellery, (nascida em 19/04/1884 e falecida em 31/10/1923), eram meus avós paternos.
Após o falecimento de Córa, Dr. Barreira casou-se a segunda vez com sua cunhada Anna de Góes Ellery (Tia Nóca) nascida em 10/05/1885 e falecida em 12/07/1960. Córa e Ana eram irmãs de Angelina de Góes Ellery*, todas filhas do coronel Eduardo Saldanha Ellery e Angélica de Góes Ellery, netas paternas de Henry Ellery, inglês natural da cidade de Liverpool, c.c. Ana de Castro Saldanha.



Córa Ellery Barreira








Do casamento de Ignácio com Córa, nasceram onze filhos:

F1- Eduardo Ellery Barreira, bacharel em direito, Ministro do TCE
F2- Ignácio Ellery Barreira, engenheiro agrônomo
F3- Juarez Ellery Barreira (falecido aos 5 anos de idade)
F4- Angélica Ellery Barreira
F5- Eduíno Ellery Barreira, cirurgião dentista
F6- Juarez Ellery Barreira, engenheiro agrônomo
F7- Adalberto Ellery Barreira, cirurgião dentista
F8- Violeta Ellery Barreira
F9- Iridéa Ellery Barreira
F10-Margarida Ellery Barreira
F11-José Ellery BarreiraJosé Ellery Marinho de Góes* (Zelito)


Juarez, José (Zelito), Adalberto, Ignácio, Eduíno e Eduardo.
José (Zelito, meu pai), Eduíno, Eduardo, Ignácio, Juarez e Adalberto
Violeta, Margarida, Angélica, Córa e Iridéa.


Do segundo casamento de Ignácio, nasceu uma única filha:
F12- Córa Ellery Barreira, professora, solteira.



José Ellery Marinho de Goes - ZELITO
José Ellery Marinho de Góes* (Zelito), era meu pai.
Foi o décimo primeiro filho de Ignácio e Córa, nascido em Quixadá, em 23/10/1923, registrado com o nome de José Ellery Barreira. Córa faleceu uma semana após seu nascimento. O Dr. Barreira ficando viúvo, entregou-o recém-nascido para a cunhada, Angelina Ellery Marinho de Góes, c.c. José Marinho Falcão de Góes, seu primo. O coronel Zé Marinho, homem culto, poliglota, era Engenheiro Agrônomo, formado pela Universidade de Louvain, na Bélgica.
Eles não tinham filhos e perfilharam o sobrinho com o nome de José Ellery Marinho de Góes.

Angelina e José Marinho Falcão de Goes


JOSÉ casou-se com Maria Emília Lopes de Mattos Brito, 
primeira filha do coronel Arcelino (Queiroz) de Mattos Brito e de dona Noemi Castello Branco Lopes, proprietários do sítio Brejo em Guaramiranga, onde se realizou a festa do casamento em 28/09/1950.

Casamento de José e Maria Emília - 28/09/1950


O casal foi morar no sítio Logradouro, em Guaramiranga.

Sítio LOGRADOURO - Guaramiranga - Ceará

Descendentes de
JoséEllery Marinho de Goes e de
Maria Emília de Mattos Brito Góes:

11 filhos - 25 netos - 9 bisnetos

F1 - Claudia Maria Mattos Brito de Góes, artista plástica, divorciada de Francisco Luiz Oliveira Nepomuceno, médico veterinário, pais de:
N1 - Laura de Góes Nepomuceno Leal, Socióloga, Corretora de Imóveis, c.c. Gilson Mello Leal, Administrador de Empresas e representante comercial, pais de:
Bn1-João José (nasc. em 13/05/2008)
Bn2-João Miguel (nasc. em 13/05/2008)
N2 - Daniel de Góes Nepomuceno, Engenheiro Agrônomo, pai de:
Bn3-Victor Henrique Borges de Góes Nepomuceno (filho de Diana Maria Borges, fonoaudióloga), c.c. Rosângela Lopes Carvalho de Goes Nepomuceno, Pedagoga, pais de:
Bn4-Saul Lopes Carvalho de Góes Nepomuceno (nasc. em 14/08/2006)

Bn5-Sophia Lopes Carvalho de Góes Nepomuceno (nasc. em 19/05/2011)
N3 - Renata de Góes Nepomuceno, Geógrafa, c.c. Janus Lönngren Sampaio, Fotógrafo e Designer, pais de:
Bn6-Luiza de Góes Nepomuceno Lönngren Sampaio (nasc. em 27/06/2010)
N4 - Raquel de Góes Nepomuceno, Administradora de Empresas, casada com Danilo Ramos, empresário em SP.
N5 - Fernando de Góes Nepomuceno, Produtor Musical, casado com Milene Pimentel Ribeiro, 
Administradora de Empresas, pais de:
Bn7 -Maria Fernanda Pimentel de Goes Nepomuceno.

F2 - Arcelino de Mattos Brito Neto, Piloto civil da Petrobrás, c.c. Zélia Maria Menezes de Mattos Brito, pais de:
N6 - Gaudioso Menezes de Mattos Brito Góes, Sociólogo, universitário de Direito.
N7 - Yuri Menezes de Mattos Brito Góes, formado em Informática.
N8 - José Ellery Marinho de Góes Neto, universitário.

F3 - Vera Góes Ferreira Costa, Jornalista, c.c. Marcus Roberto Ferreira Costa, administrador de empresas, pais de:
N9 - Antônio José Góes Ferreira Costa, universitário de Agronomia.
N10-Marcus Roberto Góes Ferreira Costa, Engenheiro Agrônomo, c.c. Virgínia Torquato Callou, psicóloga.
N11-George Henry Góes Ferreira Costa, universitário.

F4 - Ten. Cel. Av. Danilo de Mattos Brito Góes, Piloto reformado da Aeronáutica e Piloto civil da Petrobrás, pai de:
N12-Danielle Magalhães Góes, advogada;
c.c. Giovana Lorna Lopes Nogueira Góes, advogada, servidora pública federal, pais de:
N13-Camila Lopes de Mattos Brito Nogueira Góes, universitária.
N14-Pedro Ignácio Nogueira Góes, estudante.

F5 - Maria Tereza Góes Sottomayor Negrão, artesã, c.c. o português João Carlos Falcão Sottomayor Negrão, Engenheiro Mecânico, pais de:
N15-Luís Marcos Góes Sottomayor Negrão, universitário.

F6 - Marília de Góes Esperon Reis, artista plástica, c.c. Ten. Cel. Av. Ricardo Esperon Reis, Piloto reformado da Aeronáutica e Piloto civil da Petrobrás, pais de:
N16-Ricardo de Góes Esperon Reis, Engenheiro Civil, c.c. Priscila Alencar, Enfermeira.
N17-Rodrigo de Góes Esperon Reis, Engenheiro Agrônomo
N18-Rafael de Góes Esperon Reis, Administrador de Empresas.

F7 - Germana de Mattos Brito Góes Giglio, Advogada, servidora pública estadual, c.c. Leonardo da Rosa Giglio, Fonoaudiólogo, pais de:
N19-Leonardo da Rosa Giglio Filho, Advogado.

F8 - Angelina de Mattos Brito Góes, Advogada, servidora pública estadual, mãe de:
N20-Liana de Mattos Brito Góes, formada em moda pela London College of Fashion em Londres, casada com o grego Christos Ballas, Administrador de Empresas, pais de:
Bn8-Emilly Maria Goes Ballas

Bn9 -Peter Goes Ballas

F9 - Heloisa de Mattos Brito Góes, pedagoga, solteira.

F10 - Francisco José de Mattos Brito Góes, fazendeiro, c.c. Maria Jocicléa Cabral Maciel de Góes, pedagoga, pais de:
N21-Guilherme Cabral Maciel Góes, estudante.
N22-Mariana Cabral Maciel Góes, estudante.

F11 - Narcélio de Mattos Brito Góes, Engenheiro Agrônomo, c.c. Cynthia Diógenes Mendonça de Mattos Brito Góes, médica veterinária, servidora pública federal, pais de:
N23-Sarah Diógenes Mendonça de Mattos Brito Góes, universitária.
N24-Caio Diógenes Mendonça de Mattos Brito Góes, estudante.
N25-Thiago Diógenes Mendonça de Mattos Brito Góes.



"Quod potui feci; faciant meliora potents".

"Quanto a mim escrevo até este ponto;
o que depois se passou, talvez outro queira tratá-lo".
Xenofonte, "Helênicas"



Fonte de Pesquisa:
– LIMA, Esperidião de Queiroz – Antiga Família do Sertão – 1946
– LEAL, Vinicius Barros – História de Baturité – 1981
– LEAL, Vinicius Barros – A Colonização Portuguesa no Ceará – 1983
– SOUSA, José Bonifácio – Quixadá & Serra do Estêvão – 1997
– SOUSA, José Bonifácio – Dicionário Bibliográfico do Ceará
– GIRÃO, Raimundo – Famílias de Fortaleza (Apontamentos Genealógicos) 1975
– GIRÃO, Raimundo – Montes, Machados e Girões - 1967
– GIRÃO, Raimundo – Pequena História do Ceará - Instituto do Ceará – 1962
– ABREU, Capistrano de – Caminhos Antigos e Povoamento do Brasil
– ABREU, Capistrano de - Capítulos da História Colonial (1500-1800) – 1934 (pág. 128)
– RIBEIRO, Valdir Uchoa – Genealogia da Família - 1999 
– BARREIRA, Inácio Ellery – Origem da Família Barreira - Livreto - 1986
– BARREIRA, Eduardo Ellery - Cel. Nanan - Livreto - 1979
– BRÍGIDO, João – Ceará (Homens e Factos) – 1919
– TORCÁPIO, Raimundo – Revista Do Instituto do Ceará – Algumas Linhagens de Famílias do Sul do Ceará (Revista Trimestral)
– Anotações, registros pessoais, fotos e textos do arquivo de família.

“Feliz a família cujos membros se interessam pelos antepassados e sua história...”
Rachel de Queiroz